Muitos leitores que me questionam sobre o
fato de frequentemente eu afirmar que determinada dúvida não se trata de um
problema do tipo certo ou errado.
Em razão disso, vou reproduzir
uma coluna já publicada aqui.
O primeiro destaque é o
professor Walmírio Macedo, mestre a quem muito respeito. Tive a honra de
merecer um fax que é um verdadeiro tratado sobre o ensino da nossa querida
língua portuguesa.
Reproduzo aqui alguns trechos
para que os leitores possam tirar suas próprias conclusões:
“Passou-se a defender que tudo
é certo. O mal que esse tipo de colocação provocou no ensino da Língua
Portuguesa no Brasil foi muito grande, pois criou um desinteresse geral pelos
estudos da língua propriamente dita, colocando nas escolas no seu lugar o
estudo de conceitos linguísticos. Infelizmente, isso causou um atraso. É bem
verdade que vivíamos uma época de exagerado ensino gramatical, de ensino da
gramática pela gramática. Mas a substituição foi pior. Graças às colunas de
Língua Portuguesa, o interesse pelos estudos da língua parece retornar ou
reavivar.
Não se pode nem se deve ser
radical em nenhum campo da vida humana. Todo usuário da língua tem de se
preocupar em conhecer os elementos mínimos que lhe ofereçam a opção de uma
linguagem padrão oficial, geral. Como temos de usar determinadas roupas para
determinadas ocasiões, temos de ter a nossa linguagem, a linguagem apropriada.
Dessa forma, o conceito de correto e incorreto pode coincidir com o de adequado
e inadequado.”
O segundo destaque é o nosso
querido mestre Evanildo Bechara. Vejam o que ele disse a respeito do conceito
de certo e errado:
“Até bem pouco tempo, a língua
foi vista como um organismo homogêneo e unitário, e a linguística veio mostrar
que não, que a grande característica da linguagem humana é a variedade, porque
ela acompanha o homem e, como o homem não é igual numa mesma sociedade, a sua
expressão linguística não pode ser igual. Então os linguistas procuram mostrar
que a linguagem se caracteriza pela sua multiplicidade de realidades.
Então, o que é correto na
língua? É tudo aquilo que está de acordo com uma tradição. Correto é tudo que
está na norma de uma realidade. Ora, como na língua há diversas realidades, uma
língua não é um sistema, é um conjunto de sistemas, cada sistema tem a sua
norma. Se existe uma comunidade que diz “chegar em casa”, essa é a norma da
comunidade; se existe uma outra comunidade que diz “chegar a casa”, essa é a
norma.
Agora, em casa nós comemos
peixe e carne com o mesmo talher, bebemos água e vinho no mesmo copo. Essa é a
norma. Mas, se formos a um restaurante sofisticado, encontramos o copo de
vinho, o copo de água, o talher de carne, o talher de peixe. O que isso
significa? Isso significa que acima das normas, existe a etiqueta social.
Então, o que é correto? A palavra correto já não serve. A palavra que se vai
usar é exemplar. E o que é exemplar? Exemplar é aquilo que você, como pessoa de
cultura, está condicionado a usar: “chegar a casa”; “faz dez anos”; “deram
10h”. Isso não é correto nem incorreto, é o exemplar. É aquilo que pessoas,
através das gerações, escolheram como modelos exemplares. E onde está essa
exemplaridade? Está nas boas gramáticas, nos bons dicionários, e no uso efetivo
dos escritores modelares, nos escritores clássicos.”
Aqui estão as opiniões de dois
grandes estudiosos da nossa língua.
Como todos podem observar, nada
de radicalismos. É por isso que, sempre que possível, tento fugir do
tradicional conceito do certo e errado.
Prefiro a moderação, o conceito
de adequação. Isso não significa aceitar o “erro”. Isso significa analisar caso
a caso, ter bom senso, ver que determinados fatos linguísticos podem ser
adequados em certas situações, observar com mais atenção os casos polêmicos,
estar atento às transformações da língua, ouvir os especialistas e ter a humildade
de pedir a opinião dos seus leitores.
Em qualquer festa, um croquete
bem feito tem seu valor.
CRASE?
Internauta quer saber se na
frase “…sua competência aliada a forte dose de bom humor tem contribuído para
melhorar meu desempenho profissional…” está faltando o acento da crase.
Ela pergunta: “em aliada a
forte dose de bom humor, usa-se ou não a preposição?”
Há preposição, mas não ocorre a
crase: “…aliada a forte dose de bom humor…”
A preposição “a” é exigência do
adjetivo “aliado”: aquilo que está aliado está aliado “a” alguma coisa.
Não ocorre crase por falta do artigo definido feminino “a”. A
tal “forte dose de bom humor” está usada num sentido genérico (= sem artigo
definido). É como se fosse: “sua competência está aliada a uma forte dose de bom humor”. Repare na
ausência de artigo definido, caso fosse um substantivo masculino: “…sua
competência está aliada a forte empenho…”
Portanto, não ocorre a crase
porque temos apenas a preposição “a”.
Avaliação técnica-econômica ou técnico-econômica?
O correto é “avaliação
técnico-econômica”.
Quando temos um adjetivo
composto, somente o segundo elemento se flexiona: “candidatos
social-democratas”, “olhos azul-claros”, “questões luso-brasileiras”,
“problemas político-econômicos”…
MORTO ou FALECIDO?
Comentário de um leitor: “Toda vez que nossos jornais fazem
alusão a pessoas já falecidas, é assim noticiado: ‘Darci Ribeiro, morto no ano tal…’ Parece que o ilustre
antropólogo foi morto por alguém, que sua morte não foi decorrente de causas
naturais.”
Concordo com o nosso leitor. Embora morto e falecido sejam palavras sinônimas, o uso da
forma “morto” pode causar ambiguidade. Nesses casos, prefiro a forma falecido,
embora não seja usual no meio jornalístico.
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