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segunda-feira, 8 de abril de 2013

Dúvidas dos leitores


Dúvidas semânticas
A palavra é sempre um assunto apaixonante. Algumas vezes somos traídos por nós mesmos. Imaginamos que conhecemos o significado de uma palavra, e de repente a surpresa: lá está o velho dicionário para nos dar mais uma lição.
A coluna de hoje é feita com a contribuição dos nossos leitores.
1ª) Leitor quer saber: “Uma decisão ARBITRADA é necessariamente ARBITRÁRIA?”
Segundo a maioria dos nossos dicionários, deveríamos fazer a seguinte distinção:
a)    “Uma decisão ARBITRADA” é aquela que foi julgada por um árbitro. ARBITRAR é decidir na qualidade de árbitro; sentenciar como árbitro. ÁRBITRO é o juiz nomeado pelas partes para decidir as suas questões.
b)    “Uma decisão ARBITRÁRIA” é resultante de arbítrio pessoal, ou sem fundamento em lei ou em regras.
Portanto, uma decisão ARBITRADA não é necessariamente ARBITRÁRIA.
2ª) Outra leitora apresenta sua dúvida: “Hoje não leio nada que contenha o termo LENDÁRIO, e sim LEGENDÁRIO. Sei que lenda em inglês é legend, mas por acaso estou equivocada ou nós temos uma palavra apropriada para o termo aportuguesado?”
Segundo nossos dicionários, LENDÁRIO e LEGENDÁRIO podem ser usados como sinônimos. Está registrado no dicionário Michaelis: “LEGENDÁRIO 1. Que se refere a legenda. 2. Que é da natureza das lendas; lendário.”
LENDÁRIO é derivado de LENDA (narrativa em que fatos históricos são deformados pela imaginação popular ou pela invenção poética);
LEGENDÁRIO é relativo a LEGENDA (inscrição, dístico, letreiro, vida dos santos, lenda).
3ª) Leitor quer saber: “a diferença entre ESTÓRIA (=fantasia) e HISTÓRIA (real) ainda está valendo?”
O problema é que a palavra HISTÓRIA pode ser usada tanto para as narrativas de fatos (=realidade) quanto para as lendas, fábulas, narrativas de ficção (=fantasia). ESTÓRIA é sempre ficção.
Não podemos é afirmar que a palavra ESTÓRIA não existe, pois está devidamente registrada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa e em muitos dicionários: Cândido de Figueiredo, Caldas Aulete, Aurélio, Michaelis…
Nós podemos, portanto, fazer a velha distinção HISTÓRIA (=real) e ESTÓRIA (=ficção) ou usar a palavra HISTÓRIA para os dois casos.
4ª) Comentário do leitor: “Não existe HILÁRIO como adjetivo de ‘algo engraçado’, como insistem em escrever. O dicionário registra HILARIANTE.”
O nosso querido leitor deve ter sido traído da mesma forma como eu já fui muitas vezes. Consultar um único dicionário é sempre perigoso. O dicionário Caldas Aulete só registra HILARIANTE, entretanto a palavra HILÁRIO, usada como adjetivo (=que provoca o riso), aparece em outros dicionários (Michaelis, Larousse, Ruth Rocha…) e no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.
Eu também prefiro o adjetivo HILARIANTE, mas não posso afirmar que HILÁRIO não existe.
A palavra é um assunto riquíssimo que merece ser tratado com carinho e atenção.

ENTRE SI ou ENTRE ELES?
a)    Usamos ENTRE SI, sempre que o sujeito pratica e recebe a ação verbal: “Os políticos discutiam entre si”. Aqui, o sujeito (=os políticos) pratica e recebe a ação verbal.
b)    Usamos ENTRE ELES, quando o sujeito é um e o complemento é outro: “Nada existe entre eles”. Nesse caso, o sujeito é “NADA” e o complemento é “ENTRE ELES”.
Vejamos mais exemplos:
Os jogadores brigavam ENTRE SI mesmos.”
Eles repartiram o prêmio ENTRE SI.”
O prêmio foi repartido ENTRE ELES.”
O segredo ficou ENTRE ELES mesmos.”

DESEMPOEIAR ou DESPOEIRAR?
Leitor quer saber: “Na área de controle ambiental, vejo muito ‘SISTEMAS DE DESPOEIRAMENTO’. Prefiro ‘SISTEMAS DE DESEMPOEIRAMENTO’. O verbo é EMPOEIRAR. O contrário não seria DESEMPOEIRAR?“
O nosso leitor tem razão em parte. A maioria dos nossos dicionários só registra os verbos EMPOEIRAR e DESEMPOEIRAR. Logo, a forma DESEMPOEIRAMENTO é a mais recomendável.
Entretanto, é importante saber que o neologismo DESPOEIRAMENTO e o verbo DESPOEIRAR já estão devidamente registrados no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela Academia Brasileira de Letras.
Portanto, você pode preferir a forma DESEMPOEIRAMENTO, mas não deve afirmar que DESPOEIRAMENTO não existe ou que seu uso esteja errado.


co� � # 6 ^ �� os observar o exemplo que um leitor nosso encontrou no livro Memorial do Convento do grande escritor português José Saramago: “…são eles quem está construindo a obra que lhe vou mostrar…”

Nesse caso, embora o antecedente esteja no plural, o autor faz o verbo concordar com o pronome QUEM: “…eles quem ESTÁ construindo…”
Corretíssimo.

Pode-se tornar OU pode se tornar?
Leitor nos escreve: “Na versão eletrônica do Estadão, lia-se a seguinte frase ‘Corinthians pode-se tornar campeão domingo’. Não sei se se trata de um erro de impressão ou, pior ainda, de gramática, mas parece-me que a frase é incorreta.”
A frase pode perecer estranha, mas não está errada. Trata-se de uma ênclise do verbo auxiliar (=pode-se tornar). Essa colocação do pronome átono após o verbo auxiliar é raríssima no português do Brasil. A maioria dos brasileiros diria “Corinthians pode se tornar…” (sem hífen = próclise do verbo principal).
Eu prefiro a ênclise do infinitivo: “Corinthians pode tornar-se campeão no domingo”.

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